Paulo Sá

A arte das musas

Autoria: Ana Krauss

É impossível imaginar a música sem a participação da mulher através da voz, da composição e do som de seus instrumentos. Não é novidade que a indústria musical é formada, em sua maioria, por homens e obviamente engana-se quem pensa que as divas da música do século XXI conquistaram seus espaços no showbiz sem encarar um caminho bastante obscuro.

A participação da mulher nas artes não foi menos difícil que o seu engajamento na política — que ainda caminha a passos lentos. A história da humanidade nos mostra que o trabalho feminino foi negligenciado, pois todos os ofícios eram destinados aos homens. No Brasil e em muitos outros países ainda temos o trabalho feminino menosprezado, mesmo sendo a mulher a maioria entre a população e estando à frente em quesitos como educação, por exemplo.

Recentemente, o Museu de Arte do Estado de São Paulo (Masp) abrigou a exposição “História das Mulheres”, com pinturas e têxteis do século I ao XIX feitos por mulheres de várias partes do mundo, onde é interessante olhar para as artistas dessas épocas estabelecendo genealogias feministas, afinal, muitas delas ficaram conhecidas apenas após a morte, já que homens assinavam seus trabalhos para garantir a aprovação dos críticos e compradores. Não precisamos voltar muito no tempo para lembrar de um fato famoso: Margaret Keane tinha suas obras assinadas e vendidas pelo marido, Walter Keane, até 1970 — Tim Burton conta essa história no filme Grandes olhos, lançado em 2015.

As mulheres ganham espaço na música

Janis Joplin (1943-1970) Foto: Wikipedia

As mulheres não apenas lutaram para serem inseridas no mundo da música, como também revolucionaram um segmento que pouco as respeitava. Enquanto os homens desfilavam sua beleza e superioridade, Nina Simone e Aretha Franklin destacaram-se como grandes defensoras dos direitos civis; Janis Joplin foi a primeira mulher de destaque no mundo do rock; Joan Jett formou a primeira banda exclusivamente feminina (The Runaways) e Debbie Harry mostrou que uma mulher pode cantar, tocar e ter o estilo que quiser. Sem essas e muitas outras mulheres, cantoras e artistas da nossa geração jamais seriam respeitadas nos palcos – não sei se ainda são, mas acredito que foram essas musas das antigas que trouxeram, pelo menos, segurança às cantoras do momento.

            No Brasil, atualmente, são as cantoras sertanejas as maiores vítimas do machismo musical. Em 2017, Maiara, da dupla Maiara e Maraísa, comemorou poder ocupar pela primeira vez o palco da Festa de Peão de Barretos — o mais importante rodeio da América Latina —, por ter ouvido muitas vezes que “uma mulher jamais ocuparia o espaço dos homens de chapéu”. Além dela, outras artistas do meio já expuseram várias vezes o quanto encaram preconceito por estarem inseridas em um universo musical considerado masculino. O mesmo acontece na tradição gaúcha, por exemplo. Shana Muller, cantora de música regionalista, passa por maus bocados quando defende a igualdade de gênero em shows ou nas redes sociais.

            Dados divulgados pela Casa da Música Escuta as Minas, um projeto criado pelo Spotify, mostram a desigualdade de gênero na indústria musical: no mundo, as mulheres são apenas 12,3% dos compositores, 2,1% dos produtores e 10,4% dos indicados ao Grammy nos últimos anos.

A origem da palavra “música” vem do grego “mousikê”, que significa “arte das musas”.  Ou seja, podemos até ser inspiração para criações artísticas, mas estamos bem longe de termos nosso espaço na música garantido, sem entraves e sem preconceito.

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