Por Luiz Domingues
O mote do filme “All About Eve” é o da motivação para se chegar em algum lugar na vida, basicamente. Trata dessa forma sobre a questão da aspiração, a qual é um sentimento legítimo por natureza, mas, sob certos propósitos, a escalada que a pessoa se propõe a efetuar pode ser permeada por falcatruas e que prejudicam frontalmente outras pessoas, portanto, pode ser considerado bastante inadequada como ferramenta a ser usada.
Advém um “flashback” e essa “diva do teatro” está agora no passado. Ensopada por estar na chuva, mal-vestida e a exibir um semblante deveras sofrido, mais parece uma figura digna de dó, na porta de um teatro. Nesses termos, a história é apresentada através da trajetória dessa personagem humilde que admira uma atriz consagrada, no caso, Eve Harrington (interpretada por Anne Baxter), e a atriz bem-sucedida é Margo Channing (interpretada por Bette Davis).
Uma produtora da estrela do teatro a tirou da rua onde amargava a ação da chuva e a introduziu no camarim onde a Diva acabava de despir-se de sua personagem e conversava com o seu diretor e o escritor da peça, que encenava. Tímida e prosaica, Eve confessa ser obcecada por Margo e que a acompanha por toda a turnê. Sabe de cor todas as suas falas da peça e não faz mais nada da vida a não ser, idolatrar Margo.
Mesmo sendo temperamental e sarcástica, Margo dá uma chance para a sua pobre fã obstinada e, assim, Eve torna-se a sua assistente pessoal. Aos poucos, Eve se coloca a se envolver, a se desvencilhar de todo aquele seu jeito ingênuo e devocional.
Bingo! Eve encanta os produtores, recebe convites para atuar no cinema, passa a ganhar prêmios… o seu plano logrou êxito e seu talento de atriz fez-se por valer desde o início, quando por desfaçatez, interpretou uma pobre coitada, humilde e molhada na chuva, na porta do teatro.
Uma surpresa é guardada para o final, mas se você se envolveu com o filme e prestou atenção nas entrelinhas, verá que não foi tão surpresa assim…
O filme versa sobre a inveja, a dissimulação, o interpretar no cotidiano, vestir máscaras para obter resultados, passar por cima das pessoas a todo custo, etc. Em suma, fala sobre ambição desmedida.
Trata-se de uma produção muito sofisticada, com o uso e abuso de diálogos mordazes, alguns com requinte de crueldade, ao revelar os bastidores de um meio artístico, ambiente onde a fogueira das vaidades nunca se apaga.
“All About Eve” está sem dúvida entre os mais significativos filmes da década de cinquenta, dado, aliás, que é muito relevante ao considerar-se que a década de cinquenta foi uma das melhores da safra norte-americana.
Venceu o Oscar de melhor filme, melhor ator coadjuvante (George Sanders), melhor diretor (Joseph L. Mankiewicz), melhor som e melhor figurino.
Fora as indicações nas quais não venceu, que foram muitas, incluso melhor atriz, com Bette Davis e Anne Baxter a concorrerem juntas, o que não deixou de ser irônico na vida real.
Mankiewicz foi um diretor de longa filmografia e grandes trabalhos. “All About Eve” é um deles, sem dúvida. Gosto desse filme sobretudo pelo seu caráter dúbio, pois mesmo a versar sobre o mundo do teatro e os seus bastidores, deixa-nos a clara impressão de que a interpretação não se restringe ao palco, mas com as pessoas em geral a viverem personagens o tempo todo no mundo real.