Paulo Sá

Filme: Sob o Domínio do Mal (The Manchurian Candidate)

 

Por Luiz Domingues

Não poderia ter havido um melhor momento para lançar esse filme, do que o final de 1962, em meio à tensão gerada pela crise dos mísseis em Cuba, momento em que o planeta segurou a respiração com a possibilidade da decantada guerra atômica ser deflagrada. Foi o auge da chamada “guerra fria” e mesmo ao suspirar sob apreensão por esse perigo iminente, havia espaço para ir ao cinema assistir a um bom thriller sobre… a guerra fria…

“The Manchurian Candidate” foi baseado no livro homônimo de Richard Condon e revisitou uma intrigante trama de espionagem/sabotagem, focada na possibilidade da lavagem cerebral, como instrumento dessas ações, bem na livre especulação baseada nas famigeradas teorias da conspiração.

Nessa história, um pelotão norte-americano é capturado pelos soviéticos, durante a guerra da Coreia e enviado à região da Manchúria, na China. 

Quando tais soldados voltam do conflito para a América do Norte, um sargento é condecorado por extrema bravura, Raymond Shaw (interpretado por Laurence Harvey). 

No entanto, o que o governo norte-americano não sabe, é que o pelotão todo fora submetido a experimentos de condicionamento cerebral, para que agissem em ações de sabotagem ordenadas por agentes inimigos infiltrados, no território dos Estados Unidos. 

O capitão Bennett Marco (interpretado pelo cantor/ator, Frank Sinatra), que comandava aquele pelotão, passa a ter pesadelos terríveis e daí começa a se lembrar do ocorrido na China em termos de violação psicológica através do condicionamento pelo qual foram submetidos e, assim, comunica a sua suspeita às autoridades militares norte-americanas, que em princípio não o levam a sério.

Incomodado com a falta de apoio governamental, eis que ele resolve investigar sozinho, e a cada dia se convence de que tais soldados foram mesmo submetidos a uma dita “lavagem cerebral”, principalmente quando descobre um aliado nessa suspeita, na figura do soldado, Allen Melvin (interpretado pelo ator, James Edwards), que também sofre com tais pesadelos, sendo, na realidade, lembranças recônditas desse processo.  

Para piorar a situação, o sargento Raymond Shaw é filho de um senador com forte orientação conservadora, John Yerkes Iselin (interpretado pelo ator, James Gregory), e sua mãe, Eleanor Iselin (interpretado pela tarimbada atriz, Angela Lansbury), é uma agente secreta comunista, sendo ela em pessoa, a controladora mental do próprio filho, no curso da operação.

O objetivo é comandar o filho, para ele assassinar figuras-chave dos altos escalões do poder norte-americano, e para todos os efeitos, a se creditar os crimes a um ato de loucura ou crime comum quando feitas as devidas investigações policiais, sem haverem suspeitas em torno da rede de espionagem inimiga, ali infiltrada.  

O comando para os dominados mentais poderem agir, é mostrar-lhes uma carta de baralho, especificamente uma “Rainha de Ouros”. Com esse código-chave, o comandado ativa no cérebro a obediência absoluta e, determinado, o dominado mentalmente se torna um assassino frio a serviço dos inimigos.

O condicionamento cerebral engloba matar também qualquer possível testemunha, para não deixar rastros e, a seguir, o próprio assassino se esquecer automaticamente de toda a ação, justamente para não levantar suspeitas, ao voltar a agir como um bom cidadão, entretido em uma vida comum no cotidiano, e nem mesmo ter consciência de seus atos para sair incólume em uma eventual investigação policial. 

A história

Tudo começa a mudar quando Raymond passa a namorar, Jocelyn Jordan (interpretado pela atriz, Leslie Parrish), filha de outro senador e rival político de seu pai.

Em uma determinada festa à fantasia, Jocelyn comparece a trajar a fantasia de uma carta do baralho, justamente a “Dama de Ouros” e dispara o condicionamento cerebral em Raymond, que a mata, impulsionado pela ordem que o motivava a descartar possíveis testemunhas.  

Enquanto isso, Bennett Marco desvenda a chave hipnótica da “Rainha de Ouros” e começa a manipular Raymond, ao usar um baralho inteiramente formado por essa única carta.

Contudo, a mãe de Raymond descobre as ações de Bennett e o ameaça. A mais importante missão está por vir para o dominado Raymond e uma tensa sequência ocorre com Bennett a tentar impedir os planos dos inimigos. 

Na convenção partidária na qual o candidato à presidência dos Estados Unidos discursa, Raymond infiltra-se disfarçado como um padre católico, mas em um segundo, em que recobra parcialmente a sua consciência, suicida-se ao invés de cumprir as ordens que tinha para assassiná-lo.

Um roteiro caprichado

Por conta de um intrincado roteiro a envolver uma teia de relações e, claro, a envolver a tensão típica de um filme centrado no tema da espionagem/geopolítica, é uma obra tensa, com excelente clima em torno do thriller psicológico, a conter muitas cenas de ação e sobretudo com a devida apreensão que o tema da guerra fria sempre imprimiu, principalmente no imaginário do cidadão médio norte-americano, assombrado com um ataque nuclear iminente e sempre estimulado a enfrentar inimigos por todos os lados.

Chama a atenção a atuação de Frank Sinatra, que sempre foi subestimado como ator, por conta da sua carreira de sucesso na música e assim ser acusado costumeiramente de usar o cinema como uma mera estratégia de propaganda pessoal para amealhar novos mercados de modo a vender mais discos. 

Tal afirmação sempre foi descabida, ao se considerar que ele era um mega estrela da música há décadas nessa ocasião e certamente que não dependia desse tipo de expediente para vender mais álbuns do que já vendia sob uma proporção gigantesca para os padrões do mercado fonográfico da época.  

E mais um fato, não apenas neste filme, mas em outros nos quais atuou como ator, ele foi muito bem, com um padrão de interpretação muito acima do esperado para quem não se capacitara com afinco para tal carreira em específico, a provar que tinha um talento natural extra para exercer tal função em outro ramo da arte.

Portanto, aos invejosos de plantão ficou a constatação de que Sinatra foi um tremendo cantor e um bem razoável ator, a lhes restar como argumento negativo para denegri-lo, a sua suposta ligação com a máfia.


 

Luiz Domingues é músico e escritor

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