Por Luiz Domingues
Robert Wise foi um diretor que nunca se fechou em um estilo apenas. Pelo contrário, por ser eclético ao extremo, ele sempre procurou desafios a cada produção, ao passar de um mundo a outro, sem cerimônias.
E foi com esse espírito que desejou filmar uma película no estilo “Sci-Fi” e após ler mais de duzentos roteiros na pesquisa que empreendeu para buscar uma boa história que o motivasse, eis que ele escolheu: “The Day the Earth Stood Still” (“O Dia em que a Terra Parou”), aliás, uma sábia escolha, por sinal, pois, com tal texto, abriu-se a oportunidade que lhe concedeu a rara honra da imortalidade alcançada no cinema, ao atingir o panteão dos clássicos.
A reação comum de qualquer governo seria mobilizar o seu aparato militar de segurança e, por tratar-se dos Estados Unidos da América, cuja mentalidade nacional é sempre pautada por essa reação, tal providência foi ainda mais exacerbada devido às suas tradições bélicas.
Evidentemente que, em poucos minutos, a nave viu-se cercada por tanques, fuzileiros navais armados até os dentes e com a Força Aérea a postos para um possível bombardeio ordenado pelo presidente.
Cabe lembrar que em dez a cada dez filmes do gênero Sci-Fi produzidos pelos norte-americanos na década de cinquenta, época de seu esplendor, foram, na verdade, metaforicamente alusões ao perigo da ‘invasão de alguma nação hostil” a lhes impor um método de estrutura socioeconômica antagônica ao capitalismo que os norteia.
Trata-se de um humanoide, sem dúvida, por suas formas semelhantes à nossa, humanos terráqueos. Tal alienígena provoca uma angustiante expectativa sobre o que fará a seguir e os militares ali presentes estão com os dedos nos gatilhos, sempre a esperar a reação hostil (primeiro ponto para pensar: quem de fato é hostil, por natureza?).
Tal Ser intergalático ostenta um objeto estranho em mãos e um soldado afoito dá-lhe um tiro de fuzil, traído pelo reflexo e ato falho. Mais tarde, o próprio Ser revelaria que o objeto seria um presente tecnológico a ser ofertado ao presidente norte-americano.
Claro, os militares e as agências de inteligência como a CIA e o FBI assumem o comando e querem respostas. O alienígena chama-se: Klaatu (Michael Rennie) e mesmo ferido e atônito com a truculência dos terráqueos, insiste para falar com os principais governantes do planeta em meio a uma grande reunião, e, assim, recusa-se a falar somente com os governantes norte-americanos (segundo ponto, Wise alfineta a arrogância de se considerar que o comando do planeta é uma atribuição de uma única nação). Contudo, ao sentir que a ignorância terráquea não dar-lhe-á chance para se fazer entender, Klaatu escapa do hospital e infiltra-se pela cidade, disposto a tentar um outro tipo de abordagem para fornecer o seu recado à humanidade.
Nesse ambiente prosaico de uma pensão familiar, Klaatu/Mr. Carpenter conhece a viúva, Helen Benson (Patricia Neal) e seu filho, Bob, (Billy Grey).
Então, em uma tarde, o garoto o leva à casa do suposto cientista, mas este estudioso proeminente não se encontra naquele instante em sua residência.
Ao analisar o raciocínio expresso nessa equação, Klaatu percebe que o professor não tem a resolução do problema, pois para chegar em tal conclusão, o professor precisaria ter acesso a um estudo avançado de física que seria inexistente no planeta Terra, absorto em um nível primitivo de entendimento da matéria ante a civilização mais avançada pela qual Klaatu pertence.
O professor representaria o patamar máximo do entendimento dos humanos nessa questão naquele instante, entretanto, na contraposição, a se revelar algo muito elementar para os padrões da ciência conhecida no planeta de onde Klaatu veio.
Pois então, ele toma a liberdade e completa a equação incompleta na lousa do gabinete do professor, para deixar posteriormente um bilhete, e assim estimular que o professor o contate para estabelecer maiores explicações que certamente farão o físico ficar estupefato.
Todavia, nesse ínterim Klaatu está a ser perseguido pelas autoridades que desejam capturá-lo a todo custo e nesse momento crucial, a mãe do garoto Bob e o namorado dela, Tom Stephens (Hugh Marlowe), desconfiaram da enigmática persona do Mr. Carpenter e pretendem entregá-lo às autoridades.
Perseguido, ele é novamente ferido e dessa vez, o robô (Gort) leva-o para a nave onde o submete a um tratamento mediante a tecnologia de medicina avançada de sua civilização, que o ressuscita. A mãe do menino, Helen presencia tudo, finalmente entende os propósitos de Klaatu e mesmo atônita com a presença do imenso robô e a tecnologia exótica da nave, passa a colaborar, também.
É muito significativa a cena na qual o alienígena, Klaatu, ensina três palavras codificadas à Helen, que dão um comando ao robô para que esta criatura cibernética cesse as hostilidades e colabore. Em um momento de pânico com a sua presença ameaçadora, Helen lembra-se das palavras do idioma alienígena e as pronuncia ao robô: “Klaatu Barada Nikto”, e assim, o robô imediatamente passa a obedecê-la.
Cena final: Klaatu reaparece ressuscitado e fala sob improviso aos cientistas internacionais que o professor Barnhardt conseguiu reunir em uma reunião muito improvisada, ao ar livre. Boquiabertos, os cientistas ouvem o alienígena falar de forma veemente, sem meias palavras:
Dado o recado, Klaatu ingressa na nave, acompanhado de Gort e decola de volta ao seu planeta.
É simplesmente de arrepiar a verdade moral no discurso do alienígena e essa verdade supra ideológica é o sexto ponto crucial no filme de Wise.
“The Day the Earth Stood Still” teve enorme sucesso e foi um pioneiro no universo dos filmes de ficção científica a envolver contatos com seres extraterrestres, exatamente ao mostrá-los não como invasores hostis como geralmente a maioria dos filmes os mostra, principalmente nas produções norte-americanas, sempre preocupadas em usar a metáfora para aludir ao perigo de invasões e destruição da sua forma de pensar a civilização.
A mensagem de paz e mesmo que passada com aspereza contundente, foi uma inovação nesse tipo de abordagem em meio ao universo dos filmes e literatura Sci-Fi.
O filme influenciou até o ex-presidente Ronald Reagan, que o citou em uma reunião com o líder soviético, Mikhail Gorbachev, em 1985, quando disse-lhe que se o Klaatu aparecesse e puxasse-lhes as orelhas, seria muito mais fácil para se resolver as diferenças entre as nações…
Bem mais próximo de minha pessoal realidade trivial, conheço a banda Klatu, que desenvolve um bom trabalho autoral em torno do Rock psicodélico, progressivo e experimental e cujo nome é explícita e declarada influência do filme.
Recentemente, foi filmado um remake desse filme. Claro, tem uma tecnologia incrível de efeitos e nesse quesito nem pode ser comparado ao clássico de 1951, mas sinceramente, para o meu gosto pessoal, essa movimentação toda em torno da versão moderna, não me comoveu e eu certamente prefiro a versão original, de 1951.
O meu caso pessoal com o filme é bem típico da forma de impacto que um menino de dez anos de idade tem pelo gênero Sci-Fi, normalmente. Demorei para vê-lo pela primeira vez, mas valeu a pena, pois o assisti no primeiro semestre de 1971, quando eu tinha onze anos de idade, incompletos. A despeito da enorme defasagem a demarcar vinte anos do seu lançamento, fiquei muito impactado pelo filme e a mensagem final da história, ficou a reverberar na minha imaginação, por semanas. E certamente a perpetuar-se.
Trata-se, sem dúvida, de um dos meus filmes prediletos do gênero Sci-Fi e o recomendo, sem pestanejar.
Luiz Domingues é músico e escritor.