(autoria: Maria Vitoria)
Ela retira um pedaço de carne embrulhada em alumínio do fundo de uma bolsa de crochê azul, enquanto diz que comeu a outra metade da carne debaixo da ponte, observando os carros e as formigas que passeavam por suas canelas.
O nariz dela escorre um líquido esverdeado, pegajoso e meio espesso. A boca rachada pelo uso contínuo do álcool, acumulou uma saliva de duas noites e dois dias. Ela usa um par de sapatos de modelos diferentes. Ela me mostra suas costas e aponta para a região próxima ao pescoço e diz: “percevejos e piolhos me estupraram durante a madrugada”.
De repente, ouço uma gritaria enorme e um bater estrondoso de portas. Os seguranças pegam seus cacetetes e se aprontam para o confronto. Outras mulheres gritam junto o estardalhaço das portas. Infelizmente, há muito sol e pouca sombra por aqui.
“Eu vou tomar meu banho quieta e sossegada. Vou passar sabonete na minha buceta e no meu cu. Vocês são uns merdas, me deixem em paz”.
A mulher esmurra todas as portas do banheiro, uma por uma. Outras mulheres junto com outros homens gritam de forma descontrolada. Correntes grossas passam por entre as grades. Ferrolhos e cheiro de carniça se misturam junto com corpos que pastam por um pátio sem árvores.
A mulher permanece trancada no banheiro por mais vinte minutos e então os cacetetes arrombam as portas. “Vão se fuder todos vocês, eu preciso morrer aqui debaixo dessa chuva quente do chuveiro, antes que seja tarde demais pra mim”.