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The Incredible Shrinking Man (O Incrível Homem que Encolheu) – filme

 Por Luiz Domingues

O gênero Sci-Fi sempre atraiu um séquito de fã às salas de cinema. Fãs de literatura e histórias em quadrinhos sempre formaram a base desse público e, diferentemente de outros admiradores dos demais gêneros cinematográficos, os fãs do gênero Sci-Fi tendem a venerar de uma forma passional, ao intensificar essa paixão para a vida, no cotidiano, e, assim, a extravasar as suas emoções sob diversas formas.

O apogeu desse estilo cinematográfico, sem dúvida, deu-se nos anos cinquenta, nos Estados Unidos. Claro que nas décadas posteriores continuou-se a filmar com entusiasmo, mas na década de cinquenta, o grande sucesso dessa tendência foi muito significativo. Além da motivação infantojuvenil que naturalmente motivava esse público cativo, houve o elemento da Guerra Fria a atormentar principalmente os norte-americanos, com o temor de um iminente ataque nuclear deflagrado por parte dos soviéticos. Daí, foi inevitável que os roteiristas de Hollywood usassem e abusassem da ideia de invasões perpetradas por alienígenas com péssimas intenções para com a humanidade, a estabelecer uma clara metáfora ao “perigo” soviético.

E outro mote muito usado, foi o da consequência de um pós-Guerra Nuclear, onde os efeitos radioativos supostamente criariam mutações em animais; insetos ou mesmo nos seres humanos sobreviventes ao holocausto, ao criar todo o tipo de deformações e aberrações, com consequências nefastas. Foi sob esse contexto que o diretor, Jack Arnold, habituado a trabalhar com o gênero, adaptou um roteiro já existente e assim filmou: “The Incredible Shrinking Man” (O Incrível Homem que Encolheu, em português), um dos mais impressionantes filmes desse gênero, dos anos cinquenta.

No livro do qual se baseou para criar o roteiro (“The Shrinking Man”, de Richard Matheson), a história é contada em flashback. Mas no filme, Arnold optou pela cronologia tradicional e o famoso (e magnífico) solilóquio final, foi um adendo por sua conta, inexistente no livro.

Sendo assim, a história versa sobre um casal comum, formado por Scott e Louise Carey (interpretados por Grant Williams e Randy Stuart), que vivem felizes e sem grandes problemas na vida.

Em um dia de veraneio, aproveitam bem o mar, a bordo de uma confortável lancha, quando inesperadamente uma nuvem passa com uma estranha poeira densa e prateada, sobre a embarcação. Nesse momento, somente o marido, Scott, é atingido, visto que a esposa estava momentaneamente segura dentro da cabine da lancha. 

Ele, no entanto, não deu grande importância ao evento, pois se limitou a limpar-se daquela estranha pasta prateada que atingira o seu corpo. Entretanto, quando voltam à sua cidade, Scott começa a notar algumas alterações físicas, que, em princípio, não associa à misteriosa nuvem.

Por emagrecer rapidamente e assim notar que as suas roupas ficaram muito folgadas, repentinamente, resolve consultar um médico. Exames são feitos e o médico não consegue fechar um diagnóstico, concomitante ao fato de que Scott encolhe decididamente.

É dramática a sequência onde sucessivas adaptações são feitas para visar dar-lhe o máximo de conforto e normalidade, mas já a medir cerca de um metro de altura, é evidente que o aspecto psicológico dele ficara completamente arrasado e não houve nenhum meio para sentir-se animado quanto a uma possível reversão do quadro, em meio a tal encolhimento continuado e inexplicado.

 

Todavia, uma esperança surge através de uma nova metodologia médica proposta, que acende a sua esperança, assim como de sua esposa.  Nesse ínterim, conhece uma artista de circo. Trata-se de uma anã, que interessa-se por ele, ao considerá-lo um anão, igualmente, sem suspeitar que o seu encolhimento tem outra razão de ser. Porém, a autoestima de Scott desaba de vez quando percebe em um posterior encontro com a anã, que está menor que ela, ao denotar que o novo tratamento fracassara. A sua história torna-se pública e a imprensa assedia violentamente a família, para tornar a experiência que já era dramática, como algo ainda pior, um verdadeiro calvário para ele e toda a família Carey.

Nessa altura, Scott já ostenta o tamanho de um boneco de brinquedo e passa a habitar em uma casa de bonecas. Em um vacilo da esposa, o gato da família ataca violentamente a casinha de brinquedo, na tentativa violente para caçar o pobre, Scott que consegue safar-se desse perigo mortal, mas ele cai escadaria abaixo, no porão da casa.

Pequeno como um inseto, vê-se às voltas com um habitat que mais parece um planeta inóspito e desolador. Na luta pela sobrevivência, adapta uma caixa de fósforos como a sua nova habitação e veste-se como um troglodita pré-histórico, mediante retalhos de tecido que descobre pelo caminho.

Fósforos; alfinetes e linha de costura passam a ser as suas ferramentas e armas de defesa. Uma inundação do ralo, ganha a proporção de um autêntico tsunami… aliás, onde ele vislumbra a última chance de resgate, pois vê a sua esposa a entrar no porão, acompanhada de seu irmão (Charles Carey, interpretado por Paul Langton), motivados pela inundação, mas claro, Scott mostra-se tão insignificante que eles nem ouvem os seus gritos desesperados por socorro.

Faminto, descobre que tem um pedaço de pão velho sobre uma mesa. A escalada rumo ao encalço da comida, é épica, como se estivesse a escalar o Monte Everest. Para piorar a sua situação, no porão existe uma enorme aranha, para os padrões dele, naquele instante, que passa a persegui-lo como uma implacável predadora.

São momentos sob enorme tensão, emoldurados por uma música tensa e perfeitamente coadunada com tal terror. Cada vez menor e mais frágil, Scott não tem como enfrentá-la fisicamente, mas ainda é um ser humano e, portanto, ao usar o seu potencial de raciocínio, monta um ardil engenhoso e a mata, finalmente.

Todavia, o processo de encolhimento não cessa e ao perceber que agora está tão minúsculo que passa com facilidade por uma grade em uma janela que dá acesso à área externa da casa, atravessa-a e então o filme atinge o clímax, com um solilóquio emocionante que extrapola as fronteiras do Sci-Fi, ao beber fortemente na fonte da filosofia.

Em meio a uma belíssima trilha sonora e com uma sequência de tomadas rápidas a evocar o espaço sideral, o pensamento de Scott Carey é narrado em voz alta, ao expressar-se da seguinte maneira:

“Eu continuava encolhendo, para virar o quê? O infinitesimal.
O que eu era? Ainda um ser humano… ou o homem do futuro?
Se houvesse outras explosões radioativas… outras nuvens indo em direção a mares e continentes… será que outros me seguiriam nesse mundo vasto e novo?

Tão próximos… o infinitesimal e o infinito, mas de-repente, sabia que havia mesmo dois fins… do mesmo conceito.
O inacreditavelmente pequeno e o inacreditavelmente vasto…
Eventualmente conhecido como o fechamento de um círculo enorme. Olhei para cima… como se de alguma forma eu pudesse agarrar os céus. O universo, mundos incontáveis. A tapeçaria prateada de Deus se estendia pela noite. E naquele momento, soube a resposta para o enigma do infinito. Eu havia pensado em termos de dimensão limitada do homem. Eu havia subestimado a natureza.

O fato da existência começar a acabar…
É a concepção do homem, não da natureza.
E senti meu corpo diminuindo… derretendo, tornando-se nada.
Meus medos desapareceram e em seu lugar veio a aceitação.
Toda essa vasta majestade da criação… tinha de significar algo.
E então, também significava algo! Sim!

Menor do que o menor…
Eu também significava algo!
Para Deus, não existe o zero.
Eu ainda existo”.

Sucesso absoluto à época, “The Incredible Shrinking Man” empolgou também os críticos na época e tornou-se um filme cultuado entre cinéfilos amantes do gênero Sci-Fi. Sem dúvida que o roteiro propiciou uma gama de interpretações análogas, as mais interessantes. São inúmeros os trabalhos acadêmicos em torno da película, ao analisá-la sob vários pontos de vista. Cabe interpretações no campo da sociologia; antropologia e psicanálise.

A ideia de um homem que se diminui perante a sociedade; família; casamento e esbarra em análises metafóricas dessa espécie, contidas inerentemente na história. A filosofia também, principalmente no solilóquio final, onde a existência da vida é posta em cheque.

Realmente, somos um grão de areia na imensidão do deserto, mas sem cada minúsculo grão, simplesmente não existiria o deserto.

Um filme incrível, e que, apesar de ser antigo e com toda a tecnologia tosca de um filme classe “B”, da década de cinquenta, emociona e faz pensar.

 

 


Luis Domingues é músico e escritor.

Este post tem 4 comentários

  1. Barata Cichetto

    A primeira vez que vi era bem garoto, década de 60, e nunca me esqueci de muitas de suas cenas e falas, especialmente a parte final, que meu caro amigo “Gentleman do Rock Brasileiro” reproduziu. Ficou estampado na minha memória por décadas, até que, com a a Internet, pude encontrar e ainda agora vez ou outra assisto (Tenho no PC quardado como um tesouro). Vejo várias camadas nesse filme, aliás. Não sabia que a cena final “magnífica” como o Luiz Domingues bem comentou foi criação do Diretor. Magistral. Enfim, um filme para sempre. E parabéns pela matéria, como sempre muito bem escrita.

    1. Luiz Domingues

      Seu comentário está aguardando moderação.

      Em primeiro lugar eu agradeço muito pela ilustra visita do grande poeta e ativista cultural, Barata Cichetto ao site “Palavras & Sons” do meu amigo, Paulo Sá, no qual colaboro!

      Sobre o filme, sim, ele tem o poder da metáfora muito forte e como bem observou, por camadas ao evocar os preconceitos e expectativas/pressões exercidas pela sociedade e ao final, vem essa bela reflexão de ordem metafísica sobre a pequenez diante da imensidão e sobretudo, como cada partícula faz parte do “todo” nessa visão holística.

      Gratidão imensa por trazer a sua reflexão pessoal, com direito à sua lembrança infantojuvenil quando viu pela primeira vez (eu também assisti nos anos 1960, bem pequeno e fiquei muito impactado). Mais tarde, vi de novo por volta de 1973 no antigo “Cine Mistério” da TV Bandeirantes e já no alto dos meus treze anos, a absorver melhor o filme nas suas entrelinhas. Tempo bom no qual a grade de cinema das TV’s abertas tinha cinema de qualidade, constantemente.

      Grato pelo elogio à resenha, e pelo elogio pessoal, igualmente.

      Grande abraço, amigo Barata!

      Luiz Domingues

  2. Luiz Domingues

    Em primeiro lugar eu agradeço muito pela ilustra visita do grande poeta e ativista cultural, Barata Cichetto ao site “Palavras & Sons” do meu amigo, Paulo Sá, no qual colaboro!

    Sobre o filme, sim, ele tem o poder da metáfora muito forte e como bem observou, por camadas ao evocar os preconceitos e expectativas/pressões exercidas pela sociedade e ao final, vem essa bela reflexão de ordem metafísica sobre a pequenez diante da imensidão e sobretudo, como cada partícula faz parte do “todo” nessa visão holística.

    Gratidão imensa por trazer a sua reflexão pessoal, com direito à sua lembrança infantojuvenil quando viu pela primeira vez (eu também assisti nos anos 1960, bem pequeno e fiquei muito impactado). Mais tarde, vi de novo por volta de 1973 no antigo “Cine Mistério” da TV Bandeirantes e já no alto dos meus treze anos, a absorver melhor o filme nas suas entrelinhas. Tempo bom no qual a grade de cinema das TV’s abertas tinha cinema de qualidade, constantemente.

    Grato pelo elogio à resenha, e pelo elogio pessoal, igualmente.

    Grande abraço, amigo Barata!

    Luiz Domingues

  3. Barata Cichetto

    Querido amigo Luiz Domingues, sabes bem que admiro muito não apenas sua pessoa, como também como músico excepcional que acompanho desde o início, lá nos anos 1970, e posteriormente como escritor. Então peço licença ao Paulo Sá, dono deste site, para convidá-lo a publicar no meu reformado site Agulha.xyz. Tem 5 textos seus lá, que foram pinçados da minha revista Gatos & Alface, que “coincidentemente”, passaram a render comentários, e também a resenha que fiz do seu livro sobre cinema e Rock. Se aceitar ficarei honrado.
    Grande abraço!!!!!!!

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